Piranhas colocam em risco banhistas; biólogo aponta desequilíbrio ambiental

Turista ouvido pelo G1 teve parte do dedo arrancada por um peixe e foi submetido a procedimento médico para cauterização da ferida em razão do sangramento


A alta temporada e as temperaturas elevadas do verão têm atraído os banhistas para balneários espalhados pelo Oeste Paulista. Porém, a diversão virou motivo de preocupação para visitantes que entraram nas águas do Balneário Municipal de Rosana (SP), no Rio Paraná. Por lá, já foram atendidas cerca de 30 ocorrências de ataques de peixes, segundo o Corpo de Bombeiros.

Um biólogo explicou ao “G1” que a única espécie capaz de atacar humanos nessas condições é a das piranhas, que atualmente costumam se abrigar em vegetação submersa às margens do balneário, devido à grande vazão de água causada pela Usina Hidrelétrica de Porto Primavera.

A Prefeitura instalou placas de sinalização no local para que os banhistas não joguem lixo na água, visto que os resíduos também atraem os peixes.

O “G1” ouviu uma das vítimas dos ataques.

Sangramento incessante

Um dos ataques aconteceu no dia 10 de fevereiro, no sábado de Carnaval, e vitimou o empresário Cristiano Oliveira de Carvalho, que teve parte do dedão do pé mordido por um peixe. Ele conta que foi até o local com a família e entrou na área delimitada pelo Corpo de Bombeiros própria para banho, quando sentiu uma fisgada forte.

“Em um primeiro momento, eu acreditei que tinha colocado o pé em um caco de vidro, em alguma garrafa, alguma coisa. Mas, como a água é clara, ao levantar eu já percebi que tinha o formato de uma mordida e saía muito sangue. Então, eu tentei segurar com o dedo, apertei, comprimi e fui saindo aos poucos da água até chegar onde estava a nossa família”, relatou o banhista.

Carvalho ficou assustado com a quantidade de sangue que saiu da ferida e procurou atendimento do Corpo de Bombeiros. Após receber os primeiros socorros, foi orientado a procurar o Hospital Estadual que fica no distrito de Porto Primavera, em Rosana.

O ataque aconteceu por volta das 18h e às 19h o morador de Presidente Prudente (SP) já estava na unidade hospitalar. Ele permaneceu lá até a meia-noite do dia 11 de fevereiro, no domingo, e precisou passar por um procedimento para conter o sangramento.

“Depois de tentar fazer a contenção do sangramento por adrenalina, a médica de plantão ligou para um cirurgião, como não continha, e, depois de duas ou três horas continuou sangrando, ele orientou que fosse feita uma cauterização. Então, precisou fazer uma cauterização, ou seja, queimar todos os vasos sanguíneos que estavam na ponta do dedo, para poder conter o sangramento”, relatou o empresário.

Carvalho ainda contou ao “G1” que viu mais cinco pessoas sendo atendidas no hospital com supostas mordidas de peixes.

Balneário Municipal de Rosana (SP) - Foto: Beto Suniga

“Ser mordido, arrancado um pedaço por uma piranha, nunca tinha passado por isso, não. Eu sou frequentador de Rosana, da prainha, do lado de Jurerê, há muitos anos e também nunca tinha sofrido nada do gênero, sempre foi muito tranquilo lá o passeio, mas todos lá estão muito preocupados, porque isso é atípico”, disse o banhista ao “G1”.

Desequilíbrio ambiental

Em entrevista ao “G1”, o biólogo Ângelo Antônio Agostinho explicou que os ataques em abundância por peixes a humanos não são considerados comuns e a única espécie capaz de morder uma pessoa nessas condições é a piranha.

“Sem dúvidas é a piranha que está provocando esse problema. Podem ter peixes que usam os abrigos no balneário, mas atacando mesmo tem de ser a piranha, porque historicamente ela ataca banhistas no Brasil inteiro. Especialmente essa piranha menor, o nome científico é Serrasalmus marginatus, que antigamente só existia abaixo de Sete Quedas e, depois de [Usina Hidrelétrica de] Itaipu, subiu”, enfatizou Agostinho.

Ainda conforme o biólogo, antigamente, antes da presença das usinas hidrelétricas, tais piranhas, de 15 a 20 centímetros de comprimento, viviam em pequenos cardumes nas profundezas dos rios. Agora, com a alta vazão de água, elas vivem nas áreas próximas às superfícies e procuram se abrigar em vegetações submersas.

O desenvolvimento dessas plantas na região dos balneários se dá por fatores provocados por um desequilíbrio ambiental, na opinião do pesquisador.

“O desequilíbrio ambiental que certamente está acontecendo é a transparência da água elevada. Porque os reservatórios para cima, em Porto Primavera e os de cima também, a água quando chega ali já passou por vários reservatórios e o sedimento dela fica, vai ficando pelos reservatórios. Então, isso aumenta a transparência da água, aumenta a penetração de luz e, com isso, é possível o desenvolvimento de vegetação subaquática e essa vegetação é um ótimo hábitat para essas piranhas cuidarem da prole porque tem alimento e abrigo de outros predadores”, explicou o também professor da Universidade Estadual de Maringá (UEM), no Estado do Paraná.

Balneário Municipal de Rosana (SP) - Foto: Prefeitura de Rosana

Os ataques a humanos, conforme o especialista, se dá como uma forma de defesa do peixe em relação aos filhotes.

“As piranhas protegem a prole de uma maneira bem semelhante à galinha e seus pintinhos. Se você chega próximo, ela ataca. Como a borda da praia artificial fica mais profunda, às vezes, você não vê. O banhista passa nadando e ela pega realmente o que fica para trás, que são os pés”, afirmou.

O ideal para evitar tal situação, segundo ele, é remover periodicamente a vegetação, para que as piranhas não tenham um hábitat próximo aos banhistas.

“Realmente essa seria a solução: remover vegetação submersa ou alguma estrutura que ocorra lá na região, se tem alguma coisa que sirva de abrigo para a piranha e a prole. (...) Se você retira isso, é uma maneira de tornar o ambiente pouco apropriado para a piranha ficar por ali. A alternativa é a remoção, uma vigilância constante, principalmente, quando o balneário está sendo muito usado, porque os ataques ocorrem geralmente em dezembro e janeiro. Fevereiro menos, março vai diminuindo. Esse é o período de ataque porque é o período que ela cuida da prole”, disse ao “G1”.

O biólogo ainda explicou que os banhistas também podem auxiliar para evitar a presença de piranhas nos balneários não jogando alimentos no local, visto que os restos de comida na água também podem atraí-las.

Banhista atacado por piranha precisou de atendimento médico, em Rosana (SP) - Foto: Cristiano Oliveira de Carvalho

Sujeira deixada pelos banhistas

Em entrevista ao “G1”, o cabo Douglas Fernando, do Corpo de Bombeiros, em Rosana, disse que a corporação atendeu em torno de 20 a 30 ocorrências relacionadas a mordidas de peixes durante o período de festas de final de ano, em 2023. O Corpo de Bombeiros acredita que os ataques aconteceram devido à sujeira deixada pelos banhistas no local.

“Entre o Natal e o Ano Novo, com o balneário lotado, nós notamos que os ataques aconteceram em alguns pontos específicos, onde possuem algas. Acreditamos que aconteceram por negligência na limpeza por parte dos banhistas, que às vezes deixam cair comida, cerveja e até urinam dentro da água”, explicou.

Ainda conforme o cabo, os banhistas são orientados a não jogar lixo na área do Balneário Municipal e a descartar os dejetos nas lixeiras espalhadas pela área. Outra recomendação é não alimentar os peixes no local.

O que diz a Prefeitura

Prefeitura instalou placas com orientações aos banhistas no Balneário Municipal - Foto: Prefeitura de Rosana

Em nota, a Prefeitura de Rosana informou que realizou a limpeza no Balneário Municipal. Ainda conforme o Poder Executivo, os peixes estão em período de reprodução e usam locais específicos para colocarem seus ninhos, onde é costumeiro que os turistas joguem restos de alimentos e façam a limpeza das grelhas na beira do Rio Paraná.

Com a abundância de comida, é comum que os animais fiquem nos locais, segundo a administração municipal.

"A Prefeitura fez a sinalização no local e vem realizando ações de conscientização para que os turistas não sujem o balneário. Trabalhos em ações que possam minimizar as ocorrências, mas todas as ações dependem da compreensão dos usuários do espaço", finalizou o informativo oficial.

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